“A reserva de cadeiras precisa acontecer no Brasil”, defende desembargadora eleitoral do TRE-BA

Mais nova integrante da corte eleitoral baiana, Zandra Anunciação Parada reflete sobre a participação de mulheres na política nesta quarta (24), data marca a criação da Justiça Eleitoral e a conquista do voto feminino no país

Desembargadora eleitoral fala sobre representatividade feminina na política
Pra cego ver: Foto da desembargadora eleitoral Zandra Anunciação com toga, na sala de sessões do TRE-BA, próxima a bandeira do Brasil

O dia 24 de fevereiro é uma data simbólica para a democracia brasileira. Nesta quarta, o país comemora a criação da Justiça Eleitoral – com a instituição do Código de 1932 – e a conquista do voto feminino. Passados 89 anos, o cenário ainda é desafiador: as mulheres são maioria de eleitoras e minoria de eleitas. Mais nova integrante da corte do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA), a desembargadora eleitoral Zandra Anunciação Parada reflete sobre a importância de haver mais mulheres em cargos legislativos e executivos para o fortalecimento de políticas públicas que assegurem igualdade de direitos na sociedade.

 

TRE-BA – O voto feminino celebrado hoje (24/2) é uma das conquistas mais importantes para as brasileiras no século 20. Naquele momento, porém, votar era facultativo e restrito às mulheres casadas (desde que autorizadas pelos maridos), às viúvas e solteiras com renda comprovada. Que limitações a senhora observa que as mulheres enfrentam hoje no país, no que refere à participação política?

ZANDRA ANUNCIAÇÃO PARADA – As limitações são inúmeras.  As conquistas, em que pese, mereçam todo destaque e comemoração, sempre foram tímidas e nos custaram muito. A conquista do voto veio acompanhada de uma limitação ilógica e patriarcal de subjugação da mulher à autorização do marido, quando casada. A mulher já enfrenta, desde que nasce, uma sociedade que lhe desacredita, lhe silencia.  A mulher sempre foi estimulada a calar-se diante de seus dissabores, suas inquietações, ao passo em que o século 21, com todas as revoluções que trouxe, pôs em xeque esses costumes, apresentando – felizmente – novas frentes de debates e pensamentos, que nos proporcionaram uma maior ocupação na política. Isso porque, para se inserir no meio político, é preciso ir de encontro a todo o patriarcado predominante. A mulher mostra que, seja na condição de eleitora ou na condição de representante, sua expressão e lugar de fala são fundamentais. Assim, elar passa a ser vista, aos poucos, como autossuficiente, dissociada do comando masculino. Mas essa discussão é profunda demais e interminável. Outra limitação que pode ser citada é a falta de credibilidade conferida às mulheres na política. Não raro, suas opiniões, quando expostas publicamente, são inferiorizadas, encaradas como superficiais, desnecessárias ou desinteressantes. É o que chamo de “política da desacreditação e desvalorização da mulher”. Essa sub-representatividade vem se mostrando perversa e a luta para combatê-la é incansável. A inclusão efetiva da mulher no cenário político é condição sine qua non para que tenhamos uma democracia de fato e de direito. As limitações patriarcais são realidades presentes e que vêm tentando boicotar os ganhos adquiridos ao longo dos tempos. Como se não bastassem os desafios enfrentados por gênero, existem ainda outros preconceitos quando se trata de mulher na política. Pois não são todas as mulheres que possuem as mesmas armas, em paridade, para alcançar os postos e lugares de fala na política, existindo, ainda, desigualdades dentro do próprio gênero.

 

TRE-BA – Em 2021, as mulheres representam maioria do eleitorado, mas minorias de eleitas. Há incentivos para aumento da participação feminina, como a própria na legislação eleitoral, que determina que cada partido preencha o mínimo de 30 % e o máximo de 70% para candidaturas de cada gênero. Na prática, nem sempre isso é observado, sem contar que o efeito colateral das candidaturas laranja, observadas especialmente nas Eleições de 2018. Como driblar isso?

ZANDRA ANUNCIAÇÃO PARADA – Antes de qualquer coisa, acho importante expor um dado: de acordo o Inter-Parliamentary Union, em pesquisa publicada em 2018, o Brasil é um dos piores países em termos de representatividade política feminina, ocupando o terceiro lugar na América Latina em menor representação parlamentar de mulheres, com taxa de, aproximadamente, 10 pontos percentuais a menos que a média global. Por isso que digo que os avanços vem sendo tímidos ao longo das décadas. Nas últimas eleições, a exemplo de 2018, as candidaturas laranja vêm sendo persistentes, demonstrando nitidamente a intenção do patriarcado em manter os privilégios e postos aos homens, mediante o cumprimento forjado da lei. Os desafios, a meu ver, somente podem ser driblados com o fortalecimento dos debates provocados pelo feminismo político. Parece ideológico e ingênuo, mas é extremamente necessário. Precisamos falar e sermos vistas para que essa mentalidade possa mudar. É preciso ecoar vozes e ocupar lugares, conclamar as mulheres para promover a mudança. Sem essa união, fica difícil superar os obstáculos. A inércia é muito perigosa.

TRE-BA – Além da correção de uma desigualdade história- em que a mulher estaria no ambiente doméstico e o homem, na política- ter mais mulheres no poder público é agendar outras perspectivas para temas urgentes, como violência e saúde, mas também pautas em diversas áreas, como na cultura, economia, ciência. Em sua avaliação, qual a importância do recorte de gênero na política?

ZANDRA ANUNICAÇÃO PARADA – Importância total. Promover ações afirmativas para a inclusão da mulher no cenário político é fundamental. A mulher sempre foi predestinada aos espaços privados, notadamente aos ambientes domésticos, esteiras de produção e trabalhos que não lhe conferissem notoriedade ou que demandassem a ocupação de postos de liderança. Importante afirmar que não se desmerece aqui o trabalho doméstico ou de qualquer profissão, seja ela de trabalho manual ou intelectual. Contudo, é importante que haja liderança feminina nas mais diversas áreas, pois só assim quebraremos paradigmas e poderemos vislumbrar novos horizontes. Não há possibilidade de avanço e investimento em áreas que devem ser combatidas, como o feminicídio e a saúde da mulher, se as mulheres, maiores afetadas, continuam sub-representadas, sobretudo no Legislativo e no Executivo. A busca pela igualdade de gênero é coisa séria e, para atingi-la, é preciso adotar ações afirmativas de inclusão, na maioria das vezes coercitivas, para que todos entendam que homens e mulheres têm direitos iguais e devem usar os mesmos espaços públicos, ocupar postos de liderança e expressar suas opiniões.

 

TRE-BA – O que a senhora pensa sobre a reserva de cadeiras para candidaturas femininas, como já acontece na Argentina?

ZANDRA ANUNCIAÇÃO PARADA – A legislação da Argentina sempre foi pioneira no tocante à concentração de esforços para maior participação das mulheres no cenário político. Lá se consolidou as eleições paritárias, em que partidos  e alianças deverão apresentar o mesmo número de homens e mulheres entre seus candidatos, o que não significa que serão eleitos na mesma proporção. Na prática, se observou que, embora a eleição do candidato dependa, sobretudo, do encabeçamento das listas das alianças formadas, a representatividade da mulher na política Argentina é muito maior que na brasileira, o que nos faz crer que lá existe um conjunto de esforços (não somente de leis) e movimentos para que a desigualdade de gênero seja cada vez mais combatida.Já no Brasil, em que pese exista disposição de lei eleitoral que define cotas, não vem sendo adequadamente utilizada de maneira a favorecer a igualdade de gênero. Veja-se que a lei brasileira tem cota para gênero, e não para mulheres. A lei 9504/97 definiu a reserva mínima de 30% e máximo de 70 % das candidaturas dos partidos para cada sexo em eleições proporcionais. O que se vê, na prática, é que essa porcentagem mínima (30%) vem sendo encarada como um teto de candidatura de mulheres pelos partidos e não como piso a ser observado para cada gênero. Em outras palavras, aqui no Brasil a interpretação dada é que basta ser observado tão somente o percentual de 30% de candidatas mulheres, não havendo qualquer esforço dos partidos em ir além disso, mesmo porque há pouquíssimo investimento em candidaturas femininas. Pelo contrário, a candidatura de “laranjas” para atender ao mínimo previsto em lei ratifica a supremacia masculina na política. Em resumo, acho sim que o que vem acontecendo na Argentina deve ser observado pelo Brasil. A reserva de cadeiras é um passo, dentre tantos outros, que precisa ser dado.

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